terça-feira, 27 de junho de 2017

LIÇÃO 10 - O LIVRO DO GÊNESIS (BERESHIT) E A ARQUEOLOGIA MODERNA


        Em 1849 o arqueólogo Henry Layard encontrou na antiga capital dos assírios Nínive, na colina de Kuiundjik, o palácio de Assurbanipal  (884-859 a.C.), que abrigava uma biblioteca composta de milhares de volumes, os quais constituem a chave para a compreensão  de toda a civilização assírio-babilônica. Seus volumes englobavam toda a sabedoria do seu tempo: ocultismo – filosofia – astronomia – listas dos reis – relatos históricos – literatura poética – canções e hinos sagrados. Composta na sua maioria de cópias dos originais babilônicos muito mais antigos. Um tesouro de valor incalculável que, devidamente acondicionado, partiu para a longa viagem de Nínive á Inglaterra e ao Museu Britânico. O seu valor, porém só foi revelado decênios mais tarde, quando se tornou possível decifrar os textos. Na época, não havia ninguém no mundo que soubesse lê-los. Malgrado todos os esforços, as tabuinhas permaneciam mudas. Pouco antes de 1900, nas sóbrias salas do Museu Britânico, os velhos textos começaram a narrar de novo, após uma pausa de dois mil e quinhentos anos, um dos mais belos poemas do antigo Oriente, a cantar pela primeira vez para os assiriólogos a epopeia de Gilgamesh, o rei de Uruk meio deus, meio homem.

        Está escrito em acádico, a linguagem diplomática da época do rei Assurbanipal. Este tablete  é uma cópia daquela que se encontrava na biblioteca da Babilônia  no tempo do grande rei Hamurabi. Na epopeia original, um clássico da literatura suméria, esculpido há 5 mil anos.  Lemos a história de Ziusudra, um herói que sobrevive a uma enorme enchente graças a sua devoção ao deus Enki. Esta Divindade teria decidido destruir a humanidade, mas poupado o seu eleito e o aconselhou a levar consigo as sementes de todos os seres vivos. Ziusudra esperou sete dias, até soltar uma andorinha, um pombo e um corvo para verificar se a água já havia baixado. Mil anos depois, esta lenda sumeriana ressurgiria em um mito da Babilônia, a epopeia de Gilgamesh, relato da vida de um rei sumério que governava a cidade de Uruk. Neste relato, idêntico ao anterior, o personagem Ziusudra reaparece como Utnapishtim, o deus Enki como Ea. Qualquer semelhança entre os relatos mesopotâmicos  com   o do Gênesis  não é considerado mera coincidência pelos estudiosos.
   
         A epopeia de Gilgamesh pertence aos tesouros culturais de todas as grandes nações do antigo Oriente. Sem dúvida a redação original desta narração, o mundo deve aos sumérios, cujo povo erigiu a primitiva Ur. Gilgamesh, diz  a inscrição cuneiforme da tabuinha XI da Biblioteca de Nínive, está decidido a assegurar sua imortalidade e empreende uma longa e aventurosa viagem a fim de encontrar seu antepassado Utnapishtim, do qual espera saber o mistério da imortalidade, que os deuses lhe conferiram. Chegando a ilha onde vive Utnapishtim, Gilgamesh interroga-o sobre o mistério da vida e  este conta-lhe que viva em Shuruppak e era um fiel adorador do deus Ea. Quando os deuses tomaram a resolução de exterminar a humanidade por meio de uma inundação, Ea avisou-lhe dando a seguinte ordem:

Homem de Shuruppak: destrói tua casa e constrói um navio. Abandona as riquezas despreza os bens e salva a vida! Introduza toda sorte de semente de vida no navio que deves construir, as medidas devem ser bem tomadas”.

        A fim de facilitar a comparação entre a narração bíblica com Noé e a de Gilgamesh com Utnapishtim examine o Gênesis (capítulo 6 até 8:21;). Segue a narração babilônica:

“No quinto dia tracei sua forma., sua base media doze Iku (três  mil e quinhentos metros quadrados).
Suas paredes mediam dez gar de altura cada uma (seis metros).
Dei-lhe seis andares. Joguei no forno seis sar (medida desconhecida) de breu.
Tudo que eu tinha carreguei  e toda a sorte de semente de vida.
Coloquei no navio toda a minha família e parentela.
Toda cólera  de Adad chega até o céu, toda a claridade se transforma em escuridão.
Seis dias e seis noites sopra o vento, o dilúvio, a tempestade do sul assola a Terra.
Quando chegou a sétimo dia, a tempestade do sul, o dilúvio, foi abatida.
O mar se acalma e fica imóvel, e toda a humanidade se transforma em lodo.
Abri o respiradouro e a luz caiu no meu rosto. O navio pousou no monte Nisir.
O monte Nisir prendeu o navio e não o deixou flutuar.’

Os babilônios, assírios, hititas e os egípcios,  leram e contaram esta história uns aos outros.

HERÓIS ANÔNIMOS

         A verdade precisa ser estabelecida quanto ao autor deste majestoso achado, se Henry Layard encontrou a biblioteca de Assurbanipal, não é menos verídico que as placas contendo a epopéia foi achada pelo seu assistente Hormuzd Hassan, honra a quem também a merece.

        Neste episódio também sejamos justo e não esqueçamos de um outro herói anônimo. No ano de 1872  George Smith, este grande estudioso inglês trabalhava para decifrar as placas que Hassan havia achado. Smith após desvendar as grandes façanhas de Gilgamesh, notou que a epopeia estava incompleta, mas o que já havia decifrado o fizera ir adiante, mesmo sabendo que toda aquela revelação causaria uma verdadeira revolução na Inglaterra puritana do seu tempo, inteiramente guiada pela Bíblia. Para encontrar o restante da epopeia um verdadeiro milagre aconteceu. O jornal Daily Telegraph ofereceu um atrativo prêmio a quem fosse a Kuiundjik procurar as placas restantes que continham o final da epopeia.

        George Smith aceitou o desafio e um dos maiores milagres da história das escavações arqueológicas aconteceu, Smith encontrou as placas que faltavam.  Assim a narrativa que traz Utnapistim, como Noé e a grande enchente, catástrofe esta  que depois apareceria na Bíblia como dilúvio,  estava  completa. O deus Ea, amigo dos homens, revelou em sonho a seu protegido Utanapistim, a intenção dos deuses e lhe mandou construir um barco. Esta narrativa trouxe uma questão perturbadora para a época: a narração da Bíblia seria uma reprodução da epopeia babilônica?  Para a maioria dos arqueólogos já não se pode atribuir as passagens do Gênesis como uma invenção dos judeus, mas uma releitura dos  mitos sumérios e assírios-babilônicos.

O GÊNESIS BÍBLICO É UMA CÓPIA DO GÊNESIS BABILÔNICO?

      Os relatos da criação dos povos mais variados apresentam semelhanças incríveis. Isso é compreensível no caso de nações com histórico de intercâmbio – um povo pode ter influenciado a cultura do outro, mas é especialmente intrigante quando vemos que povos que não tiveram contato no passado possuem relatos muito similares ao Gênesis. Os povos das ilhas da Polinésia, por exemplo tem um mito muito similar ao relato do Gênesis: segundo um mito cosmogônico polinésio, só existiam inicialmente as águas e as trevas. O deus supremo separou as Águas pelo poder de seu pensamento e criou o Céu e a Terra. Ele disse:  “Que as águas se separem, que os céus se formem, que a Terra exista!"

      O Gênesis  bíblico traz um relato sobre a criação muito similar ao Gênesis babilônico conhecido por ENUMA ELISH. Este livro  tem cerca de mil linhas escritas em babilônico antigo sobre sete tábuas de argila, cada uma com cerca de 115 a 170 linhas de texto. A maior parte do Tablete V nunca foi recuperado, mas com exceção desta lacuna o texto está quase completo. Uma cópia duplicada do Tablete V foi encontrada em Sultantepe, antiga Huzirina, localizada perto da moderna cidade de Şanlıurfa na Turquia. Este épico é uma das fontes mais importantes para a compreensão da cosmovisão babilônica, centrada na supremacia de Marduque e da criação da humanidade para o serviço dos deuses. Seu principal propósito original, no entanto, não é uma exposição de teologia ou teogonia, mas a elevação de Marduque, o deus chefe da Babilônia, acima de outros deuses da Mesopotâmia.

      O ENUMA ELISH possui várias cópias na Babilônia e Assíria. A versão da Biblioteca de Assurbanípal data do século VII a.C. A composição do texto, provavelmente, remonta a Idade do Bronze, nos tempos de Hamurabi ou talvez o início da era cassita (cerca de século XVIII a XVI a.C.), embora alguns estudiosos favoreçam uma data posterior a 1100 a.C.

      Dadas as suas enormes semelhanças com a narração bíblica do Gênesis, várias discussões têm surgido sobre qual das histórias é a original e qual é uma adaptação à religião em causa. Para a cultura babilónica, o ENUMA ELISH explica a origem do poder real, a sua natureza, a permanência da instituição e a sua legitimidade. A realeza humana e terrena tem a sua origem na realeza divina. A divindade continuará a ser o verdadeiro rei e também o modelo a imitar pelo rei terreno. A existência de um modelo divino impõe limites à realeza humana. 

      O Bereshit (Gênesis) não é só um livro que narra a criação. O livro de Gênesis pode ser dividido em duas seções: História Primitiva e História Patriarcal. A História Primitiva registra (1) Criação (Gênesis 1-2), (2) a Queda do homem (Gênesis 3-5), (3) o Dilúvio (Gênesis 6-9) e (4) a Dispersão (Gênesis capítulos 10-11). A História Patriarcal registra as vidas de quatro grandes homens: (1) Abraão (Gênesis 12-25:8), (2) Isaque (Gênesis 21:1-35-29); (3) Jacó (Gênesis 25:21-50: 14) e (4) José (Gênesis 30:22-50:26).

      Deus criou um universo que era bom e livre do pecado. Deus criou o homem para ter um relacionamento pessoal com Ele. Adão e Eva pecaram e, assim, trouxeram o mal e a morte ao mundo. O mal aumentou de forma constante em todo o mundo até que houve apenas uma família em que Deus encontrou algo de bom. Deus enviou o Dilúvio para acabar com o mal, mas salvou Noé, sua família e os animais da Arca. Após o Dilúvio, a humanidade começou novamente a se multiplicar e a se espalhar por todo o mundo. Deus escolheu Abraão, através de quem Ele criaria um povo escolhido e eventualmente o Messias prometido. A linhagem escolhida foi passada para o filho de Abraão, Isaque, e então ao filho de Isaque, Jacó. Deus mudou o nome de Jacó para Israel, e os seus doze filhos tornaram-se os antepassados das doze tribos de Israel.

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